Os olhos cinzentos se fixaram no reflexo de seu rosto no espelho da suíte de seu dúplex, encarando-se, observando cada traço atrativo e delicado em sua pele alva... pareciam esculpidos pelos deuses ou anjos, chame como quiser. Herança de sua mãe, assim como os poderes sombrios que raramente faz uso. Ela nunca pediu por isso, por nada disso. Nem pela imortalidade que veio de brinde com o sangue supostamente demoníaco, isso foi o que menos pediu, o que mais odiou até o dia em questão e provavelmente o que mais odiaria, mesmo que certas vezes seu lado obscuro lhe dominasse e reagisse. Ali estava ela... diante de seu reflexo imutável, imaculado. Em seu 653° aniversário, e mal parecia ter alcançado os vinte e seis. O corpo sem qualquer cicatriz ou imperfeição estética. Uma invejável prisão disfarçada de paraíso. O que para muitas seria uma bênção, para ela era uma maldição. Se algoz? Lilith. Criatura tão odiada quanto amada, amante do aprendizado obtido pela dor. Sua mãe, que não vira mais de uma dezena de vezes em sua longa vida, e que em todas as vezes que vira, fizera questão de dizer como Alice era uma decepção por escolher se afastar do sombrio. Sim, ela o fez. Ela pertenceu à sua natureza demoníaca, ela a seguiu, por um século. E nada mais. Seu primeiro século, tortuoso, marcado pelo medo e raiva... Mas então seu lado humano gritou mais alto e ela se apagou, passou a viver como humana. Aprendeu a sentir mais que sentimentos limitados ao sofrimento, e ela nunca fez questão de esconder o quanto amava isso. Quanto amava ser comum, mesmo que usasse os poderes em certos momentos propícios... Ela ignorava constantemente sua metade sombria, tão bem quanto aprendeu a se esconder de caçadores e anjos que constantemente a perseguiam apenas por ser o que é. Aos poucos a filha de Lilith fora esquecida na maior parte do tempo, e ela estava ali encarando uma empresária, dona de uma agência de modelos reconhecida e prestigiada em toda Inglaterra e diversos pontos da Europa. Alice, a filha de Lilith e de um lenhador podre que tentou vendê-la para um homem de meia idade quando tinha apenas catorze anos para fins óbvios agora respondia à toda sociedade humana como Alice Baudelaire, filha de uma estilista conhecida na moda e de um ator prestigiado, ambos inseridos na sociedade assim como sua imagem, como seriam apagados um dia não tão distante para dar lugar a uma nova faceta da mulher de muitas histórias e rostos. Amanda Black e Richard Baudelaire deram vida à uma das mais belas mulheres de acordo com revistas de moda do mundo inteiro, Lilith e Arkadius deram vida à hibrida que diferente de uma massa de híbridos, recusou as sombras e veste uma máscara muito bem desenvolvida. Ainda assim, o adjetivo “boa” jamais se encaixaria. O mau continua correndo em suas veias e mesmo que reclusa do inferno, continua sendo parte do sobrenatural e sua metade ignorada não deixa de gritar nem um segundo sequer, principalmente na raiva, quando fica claro que Alice definitivamente não é humana.
{Fixo temporário}